quarta-feira, 2 de maio de 2012


Seres diminutos, enorme flagelo

Os vírus demoraram a ser descobertos e conhecidos, de tão diminutos. Há algumas décadas, esses seres sequer podiam ser visualizados, mesmo pelos microscópios mais potentes. Eles eram considerados por muitos cientistas como partículas inanimadas incapazes de realizar um dos atributos básicos da vida: a capacidade de se reproduzir de forma independente.

Entretanto, os aspectos da biologia e da evolução desses seres, aliados as estratégias que eles utilizam para subverter os mecanismos de defesa de nosso corpo são alguns dos temas mais fascinantes da biologia moderna. Além disso, algumas das doenças causadas por esses agentes infecciosos – as chamadas viroses emergentes – representam uma fonte de enorme inquietação para a medicina atual.

Em latim, a palavra vírus significa veneno. Antes da primeira visualização desses agentes infecciosos, acreditava-se que as doenças transmitidas por eles, conhecidas como viroses, eram causadas por venenos provenientes de algum ser vivo. Dessa forma, tentava-se dar uma explicação convincente para a incapacidade que se tinha na época de visualizar os vírus. A hipótese explicaria ainda o fato de certas doenças continuarem a ser transmitidas mesmo quando fluidos provenientes de doentes eram passados através de filtros de porcelana com poros capazes de reter bactérias, os menores organismos conhecidos na época.

Cada partícula viral, também conhecida como vírion, alcança, em média, apenas algumas dezenas de nanômetros (a bilionésima parte de um metro) e é de constituição simples. Os vírions são formados por apenas uma molécula de acido nucléico – que pode ser o DNA ou o RNA, mas nunca ambos – e por um envoltório protéico denominado capsídeo. Sob esse envoltório pode ainda estar presente um revestimento lipídico adquirido a partir da membrana plasmática da célula parasitada.

Em sua forma extracelular, os vírions podem permanecer inertes por dezenas ou mesmo centenas de anos. A simplicidade e elegância estrutural, associadas a uma elevada capacidade reprodutiva baseada em uma série de truques engenhosos voltados para ludibriar as defesas imunes e intracelulares, fazem com que os vírus se convertam em agentes infecciosos tremendamente eficientes.

Invasão e reprodução

 Quando os vírus entram em contato com suas células hospedeiras, eles perfuram a membrana plasmática celular e introduzem seu ácido nucléico no citoplasma destas. Se, nessa fase, eles conseguirem superar as defesas internas da célula, a maquinaria celular será direcionada para produzir novos vírions que, após montados, serão liberados no meio extracelular levando consigo parte da membrana plasmática da célula hospedeira ou causando sua ruptura (ciclo lítico).

Dessa forma, as células têm seu metabolismo “escravizado” e deixam de produzir as moléculas necessárias para a sua sobrevivência, dedicando-se apenas à produção de novos vírions. Em algumas ocasiões, contudo, o ácido nucléico viral poderá ser incorporado ao genoma da célula parasitada e ali permanecer de forma silenciosa, multiplicando-se juntamente com a sua hospedeira (ciclo lisogênico) até que condições favoráveis sejam alcançadas e novos vírions possam ser produzidos.

Contudo, em alguns casos, a transição entre os ciclos lisogênico e lítico jamais ocorre e o material genético dos vírions permanece incorporado de forma permanente ao genoma da célula parasitada. Genes de origem viral têm sido encontrados em todos os organismos vivos e acredita-se que a presença de alguns desses pode ser benéfica para seus portadores. Nos seres humanos, por exemplo, crê-se que o gene da ptialina, uma enzima salivar relacionada com a digestão de carboidratos, seja regulado por uma seqüência gênica de origem viral.

Durante a sua reprodução e subseqüente deslocamento de uma célula para outra, os vírions podem também levar consigo trechos do DNA das células parasitadas, contribuindo assim para um aumento da diversidade genética dos organismos hospedeiros.

Devido às suas características únicas, esses seres são hoje importante instrumento biotecnológico empregado para a introdução de genes em células. Para isso, essa metodologia emprega a capacidade dos vírions de infectar apenas um tipo celular exclusivo após reconhecerem receptores específicos na membrana plasmática.

Dessa forma, esses agentes infecciosos podem se constituir no futuro em importantes aliados da terapia genética associada com o combate de doenças humanas como a artrite, o lúpus e o câncer. Pesquisas têm, por exemplo, empregado o vírus do herpes simples para que células tumorais sejam sensibilizadas e respondam de forma melhor ao tratamento com drogas anticarcinogênicas. Para que isso ocorra, genes associados com a reprodução do vírus foram substituídos por genes que ativam drogas tóxicas para as células do tumor.

Viroses emergentes

Contudo, tradicionalmente, os vírus estão associados com muitas enfermidades humanas como gripe, sarampo, hepatite, herpes, rubéola, varíola, febre amarela, caxumba e poliomielite. Além delas, há alguns anos outras doenças têm preocupado as autoridades sanitárias de todo o mundo: são as viroses emergentes, causadas por vírus que surgem como importante problema de saúde.

 Um dos exemplos clássicos dessas viroses emergentes é a infecção pelo vírus HIV – a Aids –,atualmente disseminada por toda a humanidade e talvez uma das enfermidades humanas mais estudadas atualmente. Outras viroses emergentes que causam especial preocupação são aquelas associadas com as febres hemorrágicas. Isso se deve a seu caráter comumente letal e a sua capacidade de disseminação. Entre elas podemos citar a hantavirose e a febre hemorrágica causada pelo vírus Ebola.

As hantaviroses são enfermidades agudas que podem se apresentar sob a forma de febre hemorrágica com síndrome renal ou pulmonar. A doença é transmitida de forma sazonal por aerossóis disseminados pela urina de roedores silvestres portadores do vírus. Casos de hantavirose têm sido relatados em estados como Minas Gerais, Goiás e São Paulo, levando à morte cerca de 5% dos pacientes.

Já o vírus Ebola foi isolado em 1976, após uma epidemia de febre hemorrágica em vilas do noroeste do Zaire (África), próximo ao rio Ebola. Esse vírus está associado com um quadro de febre hemorrágica extremamente letal, que acomete as células hepáticas e o sistema retículo-endotelial. Até o presente, quatro epidemias de febre hemorrágica causadas pelo vírus Ebola ocorreram no Zaire e no Sudão, afetando mais de 500 pessoas com um índice de mortalidade de mais de 60%.

SARS
Outra virose emergente que andou ocupando a primeira página dos jornais e os noticiários da TV é a SARS (sigla em inglês para síndrome respiratória aguda grave). Essa doença é causada por um coronavírus e foi descoberta inicialmente em novembro de 2002 na província Guangdong, no sul da China. A SARS propagou-se por diversos países, vitimando cerca de 780 pessoas.

Apesar da taxa de mortalidade ser de 9,6%, similar à da febre amarela, por exemplo, a SARS por ser transmitida diretamente de um indivíduo para outro, representa um risco maior para a saúde mundial do que infecções transmitidas por vetores e restritas a certas regiões de nosso planeta. Alem disso, como os sintomas da SARS são bastante similares aos da gripe, essa virose pode ser confundida com um simples resfriado.

Devido aos enormes riscos associados com o seu contágio, a Organização Mundial da Saúde lançou em novembro de 2003 um alerta mundial e tomou medidas para frear a sua disseminação. Essas medidas têm se mostrado eficientes e, apesar de casos terem sido registrados em dezenas de países, atualmente essa virose está sob controle.

Outra virose, foco de imensa preocupação para o sistema de saúde brasileiro, é a dengue. Essa doença é causada por quatro tipos imunológicos similares de arbovírus da família dos flavivírus que têm se disseminado pelas zonas urbanas do Brasil devido à proliferação de criadouros de seus vetores, os pernilongos Aedes aegypti (e raramente Aedes albopictus).

O termo dengue deriva-se da expressão ki dengu pepo , do dialeto africano swahili, que descreve os ataques causados por maus espíritos e foi inicialmente empregado para designar a enfermidade que acometeu alguns ingleses em uma epidemia nas Índias Ocidentais Espanholas em 1927-1928. Acredita-se que a dengue tenha sido trazida para o continente americano pelos colonizadores europeus, mas não é possível afirmar que as epidemias foram causadas pelos vírus da dengue, pois seus sintomas são similares aos de infecções como a febre amarela.

Atualmente, a dengue é a arbovirose mais comum que atinge o homem, sendo responsável por cerca de 100 milhões de casos por ano e colocando em risco, talvez, uma população de 2,5 a 3 bilhões de pessoas. A dengue hemorrágica e a síndrome de choque da dengue atingem pelo menos 500 mil pessoas por ano e são responsáveis por taxa de mortalidade de até 10% para pacientes hospitalizados e 30% para pacientes não tratados.

A dengue e as outras viroses emergentes são fruto do desequilíbrio ambiental associado com a ausência de vontade política para se promover medidas de saneamento básico e controle de poluição. Enquanto nossos políticos estiverem mais interessados em se autopromover em vez de se preocupar com a saúde da população, estaremos à mercê de flagelos como as viroses emergentes.


AUTORA DA POSTAGEM: Danielly Xavier

10 comentários:

  1. Os vírus perfuram a membrana celular? Explique?

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  2. sim, perfuram para que possam injetar seu material genético para que haja a reprodução do mesmo.

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  3. Não está correta essa informação! Procure texto a respeito de mecanismos de penetração dos vírus na células eucariontes, principalmente.

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  4. Os mecanismos de penetração dependem da estrutura do vírion e do tipo de célula afetada. A maioria dos vírus desnudos penetra na célula por endocitose mediada por receptores, mecanismo comum à entrada de muitos hormônios e toxinas na célula; ou por viropexia, que corresponde a translocação do vírus inteiro através da membrana citoplasmática (penetração direta). Os vírus envelopados podem se fundir com as membranas celulares para liberar o nucleocapsídeo ou genoma diretamente no citoplasma.

    Natalia Margarido Kinap

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  5. De acordo com os textos que li, depende do vírus mãe (virion).Esse virion, primeiramente se conecta a superfície da célula a ser invadida. Depois penetra no citoplasma ou, em alguns casos, injeta o material genético do vírus no interior da célula, enquanto que o capsid (camada protéica protetora em torno do material genético) permanece fora da célula. No caso da penetração do vírus completo, pode ocorrer o desenvelopamento, que é a liberação do material genético do capsid e do envelope, se presente.

    Danielly Xavier

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  6. Muito bom, Natália. Aguardo outros comentários??

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  7. Qual a relação entre vírus e evolução das células?

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  8. Os vírus são seres acelulares (que não possuem estrutura celular) e precisam de células que os hospedem. Por isso, todos os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios.

    O vírus invade uma célula e assume o comando, fazendo com que ela trabalhe quase que exclusivamente para produzir novos vírus. A infecção viral geralmente causa profundas alterações no metabolismo celular, podendo levar à morte das células afetadas. Os vírus causam doenças em plantas e animais (incluindo o homem).

    Fonte:http://www.algosobre.com.br/biologia/virus.html

    Caroline Machado de Oliveira

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  9. Vírus são estruturas simples, se comparados a células, e não são considerados organismos, pois não possuem organelas ou ribossomos, e não apresentam todo o potencial bioquímico (enzimas) necessário à produção de sua própria energia metabólica.
    Evolução pode ter começado desde o início da vida na água, bem como a cronologia da colonização da terra seca por organismos. Vírus de quase todas as principais classes de organismos - animais, plantas, fungos e bactérias/archaea - provavelmente evoluíram com seus anfitriões nos mares e os vírus emergiram das águas com seus hospedeiros diferentes.
    A maioria dos vírus de plantas terrestres são provavelmente evoluiu desde as algas verdes que surgiu + 1000 milhões de anos atrás. Existem hipóteses não confirmadas sobre a capacidade do vírus de evoluir e de onde vieram. E assim o vírus poderiam ter surgido a partir de elementos genéticos móveis que ganharam a habilidade de mover-se entre as células ou eles podem ter descendido de anteriormente organismos de vida livre que adaptado a uma estratégia de replicação do parasita ou podem ter existido antes e conduziu à evolução de vida celular. O que nos põe dúvidas se os vírus são capazes de acompanhar a evolução da célula.

    http://www.ibimm.org.br/biologia_20.html
    http://www.news-medical.net/health/Virus-Origins-(Portuguese).aspx

    Danielly Xavier

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